Para mim, Manoel de Barros é, talvez, um dos maiores modernistas que já vi. Embora sua "arte" tenha muito mais de estético do que de ideológico, sinto que seus textos têm um quê de amor, um quê de compaixão pela palavra, pela literatura que é, ao mesmo tempo envolvente e impossível de não se apaixonar...
Assim como ele, também sinto muito afeto por aquilo que os outros não ligam, ou não dão a devida importância. Os romances ditos "menores", ou "muito intimistas", ou sem tanto trabalho com a palavra, é desses que me importo. Pois como Manoel de Barros, "não gosto das palavras fatigadas de informar.
Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão.
[...]
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
[...]
Tenho em mim esse atraso de nascença.
[...]
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas [...]" (BARROS, 2003, p. IX).
E quando digo que compartilho com Manoel esse amor, essa devoção às coisas "não amadas" pelos outros, não quero com isso dizer que sou advogada das obras pobres e oprimidas; ao contrário, quero dizer que valorizo aquela beleza, aquela significância de certos romances que, por algum motivo, nem todos vêem... E como o escritor mesmo diz: " A gente descobre que o tamanho das coisas há que ser medido pela intimidade que temos com as coisas. Há de ser como acontece com o amor. Assim, as pedrinhas do nosso quintal são sempre maiores do que as outras pedras do mundo. Justo pelo motivo da intimidade".
Os livros nos quais eu compartilho um grande nível de intimidade, são para mim, muito grandes. Porque eu descobri o tamanho deles pela devoção e profundidade que eles dividiram comigo...
"O prazer de não fazer nada", é um convite aos amantes de Literatura para apreciar poesia, ensaios, fotografias, artes e muito mais.Para os bons boêmios literários, este é o lugar.Sintam-se à vontade. O espaço aqui é de tutti!
domingo, 25 de dezembro de 2011
quinta-feira, 22 de dezembro de 2011
O Leitor Incomum, Geoge Steiner
Fico impressionada quando leio um texto de George Steiner (2001) sobre um certo leitor incomum. Me delicio a cada palavra que o autor utiliza para se remeter ao sujeito que fica do outro lado do livro, do lado de fora, lendo o que uma outra pessoa escreveu. É incrível isso, não?
Tem gente que passa a vida inteira escrevendo; vive para a literatura e sobrevive exclusivamente dela. E há também os que vivem saboreando as idéias alheias. Eu sou uma delas...
Uma vez, me disseram que pior não era aquele que só escrevia livros; pior mesmo era o que passavam o tempo lendo o que os outros tinham a dizer... Não sei se é totalmente uma perda de tempo.
Para mim, a leitura não é uma simples fuga da realidade (aliás, eu nunca a considerei assim). A literatura na minha vida ocupa um lugar especial e quase que exclusivo, e não me sinto menos viva do que aqueles que aproveitam o tempo "vivendo", ao invés de ler.
Retomando George Steiner (2001), "a leitura (...) não é uma ação casual, impremeditada. Trata-se de um encontro cortês, quase que nobre, entre uma pessoa e uma daquelas "visitas importantes" cuja entrada na casa de simples imortais é evocada (...) "como num dia festivo".
E assim, confirmando o que diz Steiner (2001), diante dos "meus clássicos", me visto com a melhor das minhas vestimentas e me refugio no mais absurdo dos silêncios, para adentrar na ficção, e sofrer com meus personagens as suas dores, suas vitórias... Pois o leitor, "[...] ao fixar momentaneamente seu olhar na palavra escrita, nela procura a chama que lhe incendiará o espírito".
O livro para mim incendia meu espírito!!!!
Tem gente que passa a vida inteira escrevendo; vive para a literatura e sobrevive exclusivamente dela. E há também os que vivem saboreando as idéias alheias. Eu sou uma delas...
Uma vez, me disseram que pior não era aquele que só escrevia livros; pior mesmo era o que passavam o tempo lendo o que os outros tinham a dizer... Não sei se é totalmente uma perda de tempo.
Para mim, a leitura não é uma simples fuga da realidade (aliás, eu nunca a considerei assim). A literatura na minha vida ocupa um lugar especial e quase que exclusivo, e não me sinto menos viva do que aqueles que aproveitam o tempo "vivendo", ao invés de ler.
Retomando George Steiner (2001), "a leitura (...) não é uma ação casual, impremeditada. Trata-se de um encontro cortês, quase que nobre, entre uma pessoa e uma daquelas "visitas importantes" cuja entrada na casa de simples imortais é evocada (...) "como num dia festivo".
E assim, confirmando o que diz Steiner (2001), diante dos "meus clássicos", me visto com a melhor das minhas vestimentas e me refugio no mais absurdo dos silêncios, para adentrar na ficção, e sofrer com meus personagens as suas dores, suas vitórias... Pois o leitor, "[...] ao fixar momentaneamente seu olhar na palavra escrita, nela procura a chama que lhe incendiará o espírito".
O livro para mim incendia meu espírito!!!!
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
domingo, 18 de dezembro de 2011
Por aí...
Estava por aí visitando blogs alheios, à procura de assunto para minhas coluninhas (será que posso chamar assim??) do Dulce, e achei um desenho lindo, de uma "dona" de um blog mais lindo ainda...
Bem, plágios à parte, resolvi aproveitar a imagem e associá-la a uma frase que ouvi ontem à noite, de um artista que faleceu, chamado Sérgio Brito.
Quanto perguntado sobre a arte e seu papel, o ator respondeu:
"A arte não tem que imitar a vida. Tem que interpretá-la, somente".E não seria isso o que, exatamente, temos ouvido de nossos teóricos?
Acho que a frase de Brito vem a calhar muito bem com um autor chamado Honoré de Balzac. Que meus amigos leitores não me deixem mentir, mas em "O Pai Goriot", por exemplo, não percebemos apenas um retrato de uma Paris do século XIX. Não, não é só isso.
O leitor mais atento perceberá um algo mais naquele romance, (um psicologismo, um retrato intimista, profundo e minuncioso do ser humano) e acho que é esse algo mais de que falava Sérgio Brito.
Não imitemos, portanto, a vida. Ela já existe e está aí. Mas agucemos melhor nossos olhares para aproveitarmos, mais concientemente, o que ela nos dá a cada dia...
E quanto à imagem, bem, só achei linda mesmo...
Bem, plágios à parte, resolvi aproveitar a imagem e associá-la a uma frase que ouvi ontem à noite, de um artista que faleceu, chamado Sérgio Brito.
Quanto perguntado sobre a arte e seu papel, o ator respondeu:
"A arte não tem que imitar a vida. Tem que interpretá-la, somente".E não seria isso o que, exatamente, temos ouvido de nossos teóricos?
Acho que a frase de Brito vem a calhar muito bem com um autor chamado Honoré de Balzac. Que meus amigos leitores não me deixem mentir, mas em "O Pai Goriot", por exemplo, não percebemos apenas um retrato de uma Paris do século XIX. Não, não é só isso.
O leitor mais atento perceberá um algo mais naquele romance, (um psicologismo, um retrato intimista, profundo e minuncioso do ser humano) e acho que é esse algo mais de que falava Sérgio Brito.
Não imitemos, portanto, a vida. Ela já existe e está aí. Mas agucemos melhor nossos olhares para aproveitarmos, mais concientemente, o que ela nos dá a cada dia...
E quanto à imagem, bem, só achei linda mesmo...
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011
coisas de Menina... Teste: Você conhece as mulheres???
Recado de Helen Palmer [Clarice Lispector] para as mulheres! No Dulce far niente!!!!
Helen Palmer diz:
“Qualidades para tornar a mulher mais sedutora”
Os tempos modernos trouxeram a emancipação da mulher em quase todos os
campos. Eis um grande bem. No entanto, muita confusão se fez em tôrno [sic]
disto e o que se vê é que muitas representantes do sexo feminino entendem
que ser emancipada e ter personalidade marcante é imitar os homens em tôdas
[sic] as suas qualidades e defeitos. A agressividade, o hábito de tomar
atitudes pouco distintas em público e muitas outras coisas vêm prejudicando
a beleza da mulher e tirando-lhe o predicado que mais agrada os homens: sua
feminilidade. A faculdade de ser diferente dos homens em atitudes, palavras,
mentalidade. (Palmer, 1960).
domingo, 11 de dezembro de 2011
Algumas tirinhas...(Menina não pode!)
Analisando umas colunas do caderno "Ilustríssima" da Folha de SP, achei umas tirinhas muito interessantes de um blog mais interessante ainda...
Compartilho com vocês, porque acho que, assim como eu, vão achar o máximo. As tirinhas dessa autora refletem bem um certo estereótipo feminino, aquilo que está em voga na vida de certas mulheres, e o que os outros pensam disso.
Bem, resumindo, essa semana vocês terão algumas tirinhas de presente. Aproveitem! E comentem!!!
Compartilho com vocês, porque acho que, assim como eu, vão achar o máximo. As tirinhas dessa autora refletem bem um certo estereótipo feminino, aquilo que está em voga na vida de certas mulheres, e o que os outros pensam disso.
Bem, resumindo, essa semana vocês terão algumas tirinhas de presente. Aproveitem! E comentem!!!
sexta-feira, 9 de dezembro de 2011
Modernismo e Romance de 30
Não sei se todos sabem, mas existe a maior discussão entre os críticos literários, a respeito de o romance de 30 ser ou não considerado engajado com as propostas modernistas de 20.
Alguns admitem que na década de 30, o que se fez foi dar um passo à frente na literatura, aproveitando as propostas dos modernistas e imprimindo nelas uma outra forma, mais consistente até, de se retratar a realidade, de se perceber o mundo, dentro, é claro, de uma ótica nacional.
Mas há ainda, os que não consideram o romance de 30 como uma continuidade de idéias anteriores; a literatura nesse período seria então, algo novo, ou como já disseram, seria uma espécie de "novidade na velharia".
Alguns escritores, como Graciliano Ramos, por exemplo, não consideravam as idéias modernistas como algo aproveitável à nossa literatura; de acordo com o autor, as propostas de 20 eram bobagens e não serviam para consolidar nossas letras. Rachel de Queiroz também não se considerava seguidora ortodoxa do projeto literário de 20; algumas coisas foram aproveitadas, mas a forma de se fazer literatura, talvez tenha adquirido de fato uma nova forma, e peculiarizado aquilo que se convencionou chamar de Romance de 30, ou Regionalista, Intimista, Psicológico...
O fato é que, como diz Luís Bueno (e eu concordo plenamente), a literatura do decênio de 30, mostrou-se, ao mesmo tempo, vanguarda e diluição. E nas palavras do autor, "Tal análise, parece-nos, ainda hoje, como essencialmente correta. É fato que a década de 30 deu-nos algumas das obras mais realizadas e alguns dos escritores mais importantes da literatura brasileira".
A literatura contemporânea e os best-sellers americanos, que me desculpem, mas o projeto literário desenvolvido nas décadas de 20 e 30, no Brasil é claro, me fazem pensar o que a literatura é capaz, de fato, de fazer nas nossas vidas. Não serviu apenas só para me tornar consciente de certas realidades concernentes ao contexto social brasileiro, mas serviu também para ver o ser humano sob o viés psicológico e perceber que isso vai muito além de qualquer contexto social, de qualquer cultura ou região. A literatura brasileira desse período abrange todos os tempos, todos os espaços, pois o que ela faz nada mais é do que falar do ser humano. E isso me instiga e me envolve muito...
Alguns admitem que na década de 30, o que se fez foi dar um passo à frente na literatura, aproveitando as propostas dos modernistas e imprimindo nelas uma outra forma, mais consistente até, de se retratar a realidade, de se perceber o mundo, dentro, é claro, de uma ótica nacional.
Mas há ainda, os que não consideram o romance de 30 como uma continuidade de idéias anteriores; a literatura nesse período seria então, algo novo, ou como já disseram, seria uma espécie de "novidade na velharia".
Alguns escritores, como Graciliano Ramos, por exemplo, não consideravam as idéias modernistas como algo aproveitável à nossa literatura; de acordo com o autor, as propostas de 20 eram bobagens e não serviam para consolidar nossas letras. Rachel de Queiroz também não se considerava seguidora ortodoxa do projeto literário de 20; algumas coisas foram aproveitadas, mas a forma de se fazer literatura, talvez tenha adquirido de fato uma nova forma, e peculiarizado aquilo que se convencionou chamar de Romance de 30, ou Regionalista, Intimista, Psicológico...
O fato é que, como diz Luís Bueno (e eu concordo plenamente), a literatura do decênio de 30, mostrou-se, ao mesmo tempo, vanguarda e diluição. E nas palavras do autor, "Tal análise, parece-nos, ainda hoje, como essencialmente correta. É fato que a década de 30 deu-nos algumas das obras mais realizadas e alguns dos escritores mais importantes da literatura brasileira".
A literatura contemporânea e os best-sellers americanos, que me desculpem, mas o projeto literário desenvolvido nas décadas de 20 e 30, no Brasil é claro, me fazem pensar o que a literatura é capaz, de fato, de fazer nas nossas vidas. Não serviu apenas só para me tornar consciente de certas realidades concernentes ao contexto social brasileiro, mas serviu também para ver o ser humano sob o viés psicológico e perceber que isso vai muito além de qualquer contexto social, de qualquer cultura ou região. A literatura brasileira desse período abrange todos os tempos, todos os espaços, pois o que ela faz nada mais é do que falar do ser humano. E isso me instiga e me envolve muito...
domingo, 27 de novembro de 2011
A arte para Ferreira Gullar...
Lendo a coluna: "Um novo realismo" de hoje, Na Folha de SP, o poeta Ferreira Gullar nos dá algumas de suas impressões sobre o faser artístico. Isso tudo me encanta, porque desde que ouvi Adélia Prado dizer que a arte nasce de nossas experiências mais dolorosas, mais selvagens e brutais para, em seguida, transformar-se na máxima potencialidade de emanência, passo a coletar todos os fragmentos ditos por gente grande sobre aquilo que o ser humano, em sua essência, não conseguiria viver sem: a arte.
Então compartilho com vocês algumas palavrinas de Gullar sobre o fazer artístico.
"Quem, como eu, admite que a vida é inventada e que a arte é um dos instrumentos dessa invenção terá do fenômeno artístico, obrigatoriamente, uma visão especial.
Não é só através da arte que o homem se inventa e inventa o mundo em que vive: a ciência, a filosofia, a religião também participam dessa invenção [...].
[...] Não importa se esta ou aquela pessoa nunca viu a Capela Sistina, porque, no dia em que a vir, se renderá à sua beleza. É que somos seres culturais e não apenas porque nos apoiamos em valores éticos, estéticos (...), filosóficos, científicos- mas porque eles são constitutivos dessa galáxia inventada que é o mundo humano.
[...] Todo artista sabe que a arte não nasceu com ele e que um dos sentidos essenciais de sua obra é incorporar-se a essa galáxia cultural que costitui a nossa própria essência. Não entenda isso como uma proposta de conformismo, que seria contrária à minha própria tese de que o homem se inventa e inventa o seu mundo, já que seria impossível inventá-lo se apenas repetissem o que já existe. Por isso mesmo, é perfeitamente natural que alguns artistas de hoje busquem expressar-se sem se valer das linguagens artísticas e, sim, antes, repelindo-as, para inventar um modo jamais utilizado por artistas do passado. [...] Entre esses há os que simplesmente negam a arte e outros que pretendem criar arte valendo-se de elementos antiartísticos ou não artísticos.
[...] O que todos nós queremos é a maravilha, venha de onde vier, surja de onde surgir [...]".
Ferreira Gullar. In: Um Novo Realismo. Ilustrada, Folha de SP, 2011.
Então compartilho com vocês algumas palavrinas de Gullar sobre o fazer artístico.
"Quem, como eu, admite que a vida é inventada e que a arte é um dos instrumentos dessa invenção terá do fenômeno artístico, obrigatoriamente, uma visão especial.
Não é só através da arte que o homem se inventa e inventa o mundo em que vive: a ciência, a filosofia, a religião também participam dessa invenção [...].
[...] Não importa se esta ou aquela pessoa nunca viu a Capela Sistina, porque, no dia em que a vir, se renderá à sua beleza. É que somos seres culturais e não apenas porque nos apoiamos em valores éticos, estéticos (...), filosóficos, científicos- mas porque eles são constitutivos dessa galáxia inventada que é o mundo humano.
[...] Todo artista sabe que a arte não nasceu com ele e que um dos sentidos essenciais de sua obra é incorporar-se a essa galáxia cultural que costitui a nossa própria essência. Não entenda isso como uma proposta de conformismo, que seria contrária à minha própria tese de que o homem se inventa e inventa o seu mundo, já que seria impossível inventá-lo se apenas repetissem o que já existe. Por isso mesmo, é perfeitamente natural que alguns artistas de hoje busquem expressar-se sem se valer das linguagens artísticas e, sim, antes, repelindo-as, para inventar um modo jamais utilizado por artistas do passado. [...] Entre esses há os que simplesmente negam a arte e outros que pretendem criar arte valendo-se de elementos antiartísticos ou não artísticos.
[...] O que todos nós queremos é a maravilha, venha de onde vier, surja de onde surgir [...]".
Ferreira Gullar. In: Um Novo Realismo. Ilustrada, Folha de SP, 2011.
sábado, 26 de novembro de 2011
Sobre o último livro que li: "Jogo de damas", de David Coimbra
David Coimbra (2011), num texto divertido e muito bem humorado, conta a história de grandes mulheres que, através de suas inteligências, conquistaram não somente grandes homens, mas também dominaram grandes impérios.
Em seu novíssimo livro, “Jogo de Damas”, o autor constrói, talvez, o melhor texto que já li sobre uma definição do que é ser mulher. E nesse caso, vale para qualquer período, da pré-história até a contemporaneidade.
Compartilho um trecho com vocês!
“Camile Paglia disse que não existe um Mozart mulher pelo mesmo motivo que não existe um Jack, o Estripador, mulher. Certo. Um Jack, o Estripador, e um Mozart, um gênio e um serial killer, são moldados com o mesmo barro: a selvageria ancestral do homem.
Todos os grandes gênios da humanidade, Sócrates, Confúcio, Einstein, Leonardo da Vinci, Jesus Cristo, Freud, todos se alimentavam da mesma barbárie de um Hitler, um conde Vlado, o Empalador, um Tamerlão. Porque a grande arte só se faz com dor. Só um homem inadaptado concebe uma criação imortal. Nas curvas que o cinzel de Michelangelo esculpiu no mármore do seu Moisés estão a sua revolta, a sua inconformidade com a Civilização. (...) Se você prestar atenção naquela obra que Michelangelo levou 4 anos para concluir, (...) irá ver que existe sublimação em cada traço. Que aquilo só se faz com dor, fúria, com selvageria.
A grande arte, produto mais refinado da Civilização, é, na verdade, uma reação à Civilização. É o nosso instinto brutal, resquício das épocas primevas do Neanderthal, que nos faz grandes e cruéis.
A mulher? A mulher não precisa de nada disso. A mulher é a própria Civilização. A mulher caminha pelo mundo com os pés no chão, eqüidistante do ridículo e da façanha. A mulher olha criticamente para o homem que se jacta e sonha com a glória, e sorri com condescência. Porque a mulher, por natureza, percebe o que é realmente importante na vida: apenas a própria vida”.
Por Thaís Silva
Continua no próximo post!!
quinta-feira, 17 de novembro de 2011
Lilith, a mulher fatal
Afinal, quem foi Litith, a figura enigmática e misteriosa do mito religioso, que transforma a figura feminina num monstro de perdição, capaz de mudar os pensamentos do homem e moldá-lo de acordo com suas vontades?
Seria ela, essa monstruosa mulher que convenceu Eva a comer o fruto do conhecimento? Ou teria apenas sido a amante incontrolável de Caim, que deu-lhe um filho e fundou uma cidade com o nome de seu primogênito?
O que teria feito Lilith, para ficar caracterizada como a mulher desvirtuosa? Por que será que os homens com quem ela se envolveu não reagiram aos seus encantos?
Sei que todas essas perguntas parecem muito pós-modernas, mas acho interessante que se faça uma desconstrução da figura emblemática dessa mulher que, ao ser analisada via pinturas, gravuras e esculturas, revela uma imagem de feições delicadas e de uma beleza indescritível.
Então aqui vai minha pergunta: Teria sido Lilith tão perversa assim? Ou será que Caim, por não ter tido força suficiente para rejeitá-la, acabou "caindo em tentação" e, para justificar tal ato, relegou a figura de Lilith a causa da perdição?
Essas justificativas dadas pela tradição religiosa não me satisfazem. Creio que se o homem foi criado a imagem e semelhança de Deus, deveria ter herdado do criador a substância primordial e eficaz da inteligência. Quando Eva foi tentada pela serpente (ou Lilith, como diz o mito), por que não reagiu? Por que não recusou a maçã, já que havia sido alertada sobre a proibição daquele fruto?
A meu ver, a grande pecadora desse história, não deveria ser Lilith. Enquanto serpente (se é que ela pode ser considerada assim), ela fez o que o mal sempre faz: usa de todos os subterfúgios para arrastar as almas a perdição, ao pecado. Não era isso o que ela tinha que fazer? Pois foi isso o que ela fez. O erro foi de Eva, por ter se deixado enganar...
Quanto a Caim, convenhamos. Se Lilith representou a perdição daquele homem, o que ele representou por si só? Antes mesmo de Lilith aparecer na história, Caim já estava condenado há muito tempo. Depois que a amante entra na vida dele, ninguém mais se lembra de que ele havia assassinado seu próprio irmão? Ou seja, se deixar perder nos braços da amada insaciável e demoníaca é representado como o auge dos pecados, ao passo que matar o próprio irmão fica sendo apenas uma página da história daquele condenado...
Pois bem. Deixo aqui a minha contestação. Que não fique apenas nos ombros da pobre Lilith toda a culpa dos pecados; enquanto figura sedutora, ela não fez nada mais do que o seu papel. Ademais, uma mulher de beleza tão estonteante como aquela, seria difícil resistir aos seus encantos e aliás, sua presença serviu para completar ainda mais o mito da criação.
Por que embora temida, conseguia seduzir o homem? A suposta "magia" de Lilith pode ser vista na própria fala de Caim: "Eu estava só na Escuridão e eu tive fome. Eu estava só na Escuridão. E eu tive frio. Eu estava só na Escuridão e eu chorei. Então veio até mim uma doce voz, uma voz de mel. Palavras de auxílio. Palavras de conforto. Uma mulher, sombria e adorável, com olhos que perfuravam a escuridão, veio a mim".
E ao contrário do que reza a tradição, Lilith através da versão de Caim, não parece ter sido tão má e ter feito mal ao pobre rapaz. Ao contrário, tem-se até a impressão de que ela foi o elemento que faltava para completá-lo.
"Ela me alojou, ela me alimentou. Ela me vestiu. Nos braços dela, eu achei conforto. Eu chorei até sangue gotejou de meus olhos e ela os beijou. E eu morei durante um tempo na Casa de Lilith e lhe perguntei: "Fora da Escuridão, como você construiu este lugar? Como você fez roupas? Como você cultivou comida?" E Lilith sorriu e disse, ao contrário de você, eu estou "Acordada". Eu vejo as Linhas que giram ao redor de você. Eu faço o que eu preciso com Poder. "Desperte-me, então, Lilith" - eu disse.
Diante disso, deixo aberta a questão. Se Lilith se tornou uma figura emblemática, como é representada, ao seu favor temos o próprio acolhimento de Caim e a união com aquele que já estava perdido por natureza (nem precisa lembrar o que ele já havia feito, né?). Perdidos por perdidos, os dois até que formavam um belo casal.Ah, e mais uma coisa. As Liliths retratadas em pinturas renascentistas, neo-clássicas e até modernas que enocntrei, representam uma mulher traços delicados e frágeis. Seria uma forma de sugerir a magia sedutora por trás de sua delicadeza ou uma maneira de questionar seu estereótipo demoníaco? Não sei, mas prefiro ficar com a segunda opção...
Por Thaís Silva. domingo, 13 de novembro de 2011
Eduardo e Mônica
Lembra daquela música do Renato Russa, Eduardo e Mônica? Pois é. Acho que não tem nenhuma canção mais realista, no quesito amoroso, do que aquela.
A relação à dois deve ser daquele jeito mesmo. No começo, só aparecem as diferenças, aliás, os dois são bem diferentes mesmo, com os gostos, com os estilos, com as opiniões. Mas o que os une é o projeto de vida que eles têm em comum. Ambos sonham com o mesmo foco e é nesse ponto que eles combinam.
Eduardo e Mônica acaba se transformando numa simbologia de todos os Eduardos e as Mônicas que existem por aí. Alguns Eduardos procurando suas Mônicas, e algumas Mônicas que ainda não encontraram seus Eduardos...
Então, que viva os acasos, os encontros às escuras, as pessoas que se permitem. Que viva o Eduardo e a Mônica!!
Eduardo com preguiça de acordar enquanto Mônica já ralava antes do dia começar...
E os dois viveram juntos, e bem juntos e um belo dia uma casa só deles tiveram...
E quando menos esperavam, a chegada dos gêmeos completaram o que eles sempre quiseram!!!
Eduardooo e Mônicaaa... tralál la lá lá lá....
por Thaís Silva
A relação à dois deve ser daquele jeito mesmo. No começo, só aparecem as diferenças, aliás, os dois são bem diferentes mesmo, com os gostos, com os estilos, com as opiniões. Mas o que os une é o projeto de vida que eles têm em comum. Ambos sonham com o mesmo foco e é nesse ponto que eles combinam.
Eduardo e Mônica acaba se transformando numa simbologia de todos os Eduardos e as Mônicas que existem por aí. Alguns Eduardos procurando suas Mônicas, e algumas Mônicas que ainda não encontraram seus Eduardos...
Então, que viva os acasos, os encontros às escuras, as pessoas que se permitem. Que viva o Eduardo e a Mônica!!
Eduardo com preguiça de acordar enquanto Mônica já ralava antes do dia começar...
E os dois viveram juntos, e bem juntos e um belo dia uma casa só deles tiveram...
E quando menos esperavam, a chegada dos gêmeos completaram o que eles sempre quiseram!!!
Eduardooo e Mônicaaa... tralál la lá lá lá....
por Thaís Silva
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
Para meu amigo Dering!
Se tem uma pessoa que me faz refletir sobre o ato de escrever, esse alguém é o Renato. É claro que muito já foi dito a respeito do processo de criação do texto literário; não se pode ler uma obra pensando apenas como um reflexo do próprio autor, porque se assim o fosse, o que seria a literatura se não um simples recontar de próprias experiências, um mero espelho que refletiria apenas as próprias memórias? Não, definitivamente, literatura é muito mais do que isso.
Por outro lado, não deixo de perceber que, muito do que escrevo diz sobre o que sou, o que leio, o que ouço, o que gosto e, enfim, revela a matéria de que sou constituída. Sendo assim, quando leio uma obra e me reconheço nela, é porque, de alguma forma, aquilo que leio está me lendo também.
Assim, quando me pego em meio as discussões: "Ah não, Renato, esse seu poema tá muito melancólico! Vc anda muito deprê, heim?!" rsrs. E ele me responde: "Não sou eu que ando triste, é meu eu-lírico...", só me resta deixar o seguinte recadinho (usando as palavras de gente grande, é claro!):
"Como nos adverte Jorge Luiz Borges - toda literatura é, finalmente, autobiográfica"- (BORGES apud NEVES, 2004, p. 12).
E Margarida de Souza Neves (2004) acrescenta: "[...] Prenhe de seu autor, o texto nos leva, a cada passo, ao encontro da figura humana de [Renato], de suas idiossincrasias, do estilo do escritor, dos temas que lhe são caros, de seus interlocutores intelectuais, de sua peculiar forma de ler o mundo".
Pois é, Renato, é isso o que digo para você!
Por outro lado, não deixo de perceber que, muito do que escrevo diz sobre o que sou, o que leio, o que ouço, o que gosto e, enfim, revela a matéria de que sou constituída. Sendo assim, quando leio uma obra e me reconheço nela, é porque, de alguma forma, aquilo que leio está me lendo também.
Assim, quando me pego em meio as discussões: "Ah não, Renato, esse seu poema tá muito melancólico! Vc anda muito deprê, heim?!" rsrs. E ele me responde: "Não sou eu que ando triste, é meu eu-lírico...", só me resta deixar o seguinte recadinho (usando as palavras de gente grande, é claro!):
"Como nos adverte Jorge Luiz Borges - toda literatura é, finalmente, autobiográfica"- (BORGES apud NEVES, 2004, p. 12).
E Margarida de Souza Neves (2004) acrescenta: "[...] Prenhe de seu autor, o texto nos leva, a cada passo, ao encontro da figura humana de [Renato], de suas idiossincrasias, do estilo do escritor, dos temas que lhe são caros, de seus interlocutores intelectuais, de sua peculiar forma de ler o mundo".
Pois é, Renato, é isso o que digo para você!
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
A era "pós" dos lusitanos....
Outro dia, estava fazendo um trabalho do mestrado e iniciei algumas leituras sobre Portugal.
É incrível e, ao mesmo tempo, inacreditável pensar que depois de séculos de domínio sobre outros países, de descobertas marítimas, os portugueses enfrentam enfim, aquilo que se poderia chamar de "a era down".
Fiquei me perguntando se Camões ainda fosse vivo, e visse a atual situação de Portugal - não somente com relação ao próprio esquecimento dos grandes feitos heróicos, que outrora havia sido tão proclamado, mas também a própria indiferença do continente europeu com relação a esse país - , se ele visse tudo isso, o que ele iria escrever.
Hoje, Portugal é revisitado em José Saramago, quando esse escritor relembra a era gloriosa dos lusitanos e levanta a questão: de que serviu tantas descobertas se hoje, a nação não se encontra na própria Europa? Se hoje a nação não conseguiu ainda consolidar uma identidade verdadeiramente nacional?!
Se Camões visse isso, com certeza arregalaria os dois olhos (ops, um só) de tanto espanto e comoção.
É, muita coisa ainda tem que ser repensada sobre os lusitanos, mas que isso também nos sirva de lição; se os portugueses se sentem meio alheios ao próprio continente, e nós, brasileiros, que nunca nos propusemos na frente de outros países, que nunca descobrimos outras terras? E nós?!!
continua no próximo capítulo...
É incrível e, ao mesmo tempo, inacreditável pensar que depois de séculos de domínio sobre outros países, de descobertas marítimas, os portugueses enfrentam enfim, aquilo que se poderia chamar de "a era down".
Fiquei me perguntando se Camões ainda fosse vivo, e visse a atual situação de Portugal - não somente com relação ao próprio esquecimento dos grandes feitos heróicos, que outrora havia sido tão proclamado, mas também a própria indiferença do continente europeu com relação a esse país - , se ele visse tudo isso, o que ele iria escrever.
Hoje, Portugal é revisitado em José Saramago, quando esse escritor relembra a era gloriosa dos lusitanos e levanta a questão: de que serviu tantas descobertas se hoje, a nação não se encontra na própria Europa? Se hoje a nação não conseguiu ainda consolidar uma identidade verdadeiramente nacional?!
Se Camões visse isso, com certeza arregalaria os dois olhos (ops, um só) de tanto espanto e comoção.
É, muita coisa ainda tem que ser repensada sobre os lusitanos, mas que isso também nos sirva de lição; se os portugueses se sentem meio alheios ao próprio continente, e nós, brasileiros, que nunca nos propusemos na frente de outros países, que nunca descobrimos outras terras? E nós?!!
continua no próximo capítulo...
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
As capis (capivaras da UFV)
Haikai para elas (as capis)
No gramado da Universidade
A capivara come risonha
Dia feliz.
No gramado da Universidade
A capivara come risonha
Dia feliz.
Saber é pouco
Como é que a água do mar
Entra dentro do coco?
Um salto de sapo
Jamais abolirá
O velho poço
Quando penso
Em partir em viagem,
O fim da primavera.
Amar é um elo
Entre o azul
E o amarelo
Duas folhas na sandália
O outono
Também quer andar
Hoje à noite
Até as estrelas
Cheiram a flor de laranjeira
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
ainda Tarsilando...
A filha de Tarsila do Amaral, Dulce, faleceu em 1966, vítima de uma crise de diabetes.
Nesses tempos difíceis, Tarsila declara, em entrevista, sua aproximação ao espiritismo. Conhece Chico Xavier, com quem passa a se corresponder.
Tarsila falece em 17 de janeiro de 1973 no Hospital da Beneficiência Portuguesa, em SP. Dizem que a causa de sua morte foi a depressão (talvez pela morte de sua única filha). E assim, a artista símbolo do movimento modernista brasileiro, foi enterrada no Cemitério da Consolação, usando um vestido branco, conforme seu desejo.
Nesses tempos difíceis, Tarsila declara, em entrevista, sua aproximação ao espiritismo. Conhece Chico Xavier, com quem passa a se corresponder.
Tarsila falece em 17 de janeiro de 1973 no Hospital da Beneficiência Portuguesa, em SP. Dizem que a causa de sua morte foi a depressão (talvez pela morte de sua única filha). E assim, a artista símbolo do movimento modernista brasileiro, foi enterrada no Cemitério da Consolação, usando um vestido branco, conforme seu desejo.
domingo, 23 de outubro de 2011
Os amores de Tarsila do Amaral
Todo mundo sabe quem foi Tarsila do Amaral. Um mulher linda, que produziu obras artísticas mais lindas ainda. O que nem todo mundo sabe, é que a artista teve 4 relacionamentos amorosos em sua vida; alguns, resultaram em casamento, outros não. Tarsila foi ousada na escolha dos amigos, no estilo artístico, na ânsia de viver e conhecer o mundo e, por conseguinte, na escolha das pessoas certas para se relacionar. No começo, não foi bem assim, mas depois, sua vida foi tomando os rumos que ela queria.
O 1º casamento foi em 1918, por imposição. Tarsila se casou com um primo de sua mãe, André Teixeira Pinto, com quem teve sua única filha, Dulce.
O 2º casamento foi por conveniência, com o escritor modernista Oswald de Andrade, que durou até o momento em que ele a traiu com a artista Pagu, Patrícia Galvão.
O 3º foi um casamento mais de aventura, com um amigo médico que a levou para conhecer a União Soviética (onde Tarsila vendeu vários quadros).
O 4º casamento foi com um rapaz 21 anos mais jovem do que ela, com quem Tarsila viveu 18 anos. Na verdade, Luíz Martins chegou a dizer que ela mais vivia fora do que dentro de casa com ele, com uma convivência de marido e mulher. Mas talvez tenha sido esse um dos ingredientes que favoreceram a união dos dois. Mas é certo que ele a amava e a admirava muito, sempre apoiando e contribuindo com suas decisões.
O mais interessante é como os dois se conheceram.
"O relacionamento entre Tarsila e o jovem jornalista Luís Martins começa num jantar em homenagem aos escritores Jorge Amado, Dante Costa e Peregrino Júnior "em fins de 1933 ou começo de 1934", segundo a autobiografia de Martins, Um Bom Sujeito, publicada em 1983.
O 1º casamento foi em 1918, por imposição. Tarsila se casou com um primo de sua mãe, André Teixeira Pinto, com quem teve sua única filha, Dulce.
O 2º casamento foi por conveniência, com o escritor modernista Oswald de Andrade, que durou até o momento em que ele a traiu com a artista Pagu, Patrícia Galvão.
O 3º foi um casamento mais de aventura, com um amigo médico que a levou para conhecer a União Soviética (onde Tarsila vendeu vários quadros).
O 4º casamento foi com um rapaz 21 anos mais jovem do que ela, com quem Tarsila viveu 18 anos. Na verdade, Luíz Martins chegou a dizer que ela mais vivia fora do que dentro de casa com ele, com uma convivência de marido e mulher. Mas talvez tenha sido esse um dos ingredientes que favoreceram a união dos dois. Mas é certo que ele a amava e a admirava muito, sempre apoiando e contribuindo com suas decisões.
O mais interessante é como os dois se conheceram.
"O relacionamento entre Tarsila e o jovem jornalista Luís Martins começa num jantar em homenagem aos escritores Jorge Amado, Dante Costa e Peregrino Júnior "em fins de 1933 ou começo de 1934", segundo a autobiografia de Martins, Um Bom Sujeito, publicada em 1983.
"Sentei-me ao lado de Tarsila. E dissipando minha timidez com o vinho, foi nessa noite que tudo começou."
Luíz Martins, pintado por Tarsila.
Tarsila do Amaral
sexta-feira, 21 de outubro de 2011
"À propósito da exposição Malfatti", artigo de Monteiro Lobato ao jornal O Estado de S. Paulo, em 1917
"Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem normalmente as coisas e em conseqüência disso fazem arte pura, guardando os eternos rirmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. Quem trilha por esta senda, se tem gênio, é Praxíteles na Grécia, é Rafael na Itália, é Rembrandt na Holanda, é Rubens na Flandres, é Reynolds na Inglaterra, é Leubach na Alemanha, é Iorn na Suécia, é Rodin na França, é Zuloaga na Espanha. Se tem apenas talento vai engrossar a plêiade de satélites que gravitam em torno daqueles sóis imorredouros. A outra espécie é formada pelos que vêem anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos de cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz de escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento.
Embora eles se dêem como novos precursores duma arte a ir, nada é mais velho de que a arte anormal ou teratológica: nasceu com a paranóia e com a mistificação. De há muitos já que a estudam os psiquiatras em seus tratados, documentando-se nos inúmeros desenhos que ornam as paredes internas dos manicômios. A única diferença reside em que nos manicômios esta arte é sincera, produto ilógico de cérebros transtornados pelas mais estranhas psicoses; e fora deles, nas exposições públicas, zabumbadas pela imprensa e absorvidas por americanos malucos, não há sinceridade nenhuma, nem nenhuma lógica, sendo mistificação pura. Todas as artes são regidas por princípios imutáveis, leis fundamentais que não dependem do tempo nem da latitude. As medidas de proporção e equilíbrio, na forma ou na cor, decorrem de que chamamos sentir. Quando as sensações do mundo externo transformam-se em impressões cerebrais, nós "sentimos"; para que sintamos de maneiras diversas, cúbicas ou futuristas, é forçoso ou que a harmonia do universo sofra completa alteração, ou que o nosso cérebro esteja em "pane" por virtude de alguma grave lesão. Enquanto a percepção sensorial se fizer anormalmente no homem, através da porta comum dos cinco sentidos, um artista diante de um gato não poderá "sentir" senão um gato, e é falsa a "interpretação" que o bichano fizer um "totó", um escaravelho ou um amontoado de cubos transparentes. Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia. Essa artista possui talento vigoroso, fora do comum. Poucas vezes, através de uma obra torcida para a má direção, se notam tantas e tão preciosas qualidades latentes. Percebe-se de qualquer daqueles quadrinhos como a sua autora é independente, como é original, como é inventiva, em que alto grau possui um semi-número de qualidades inatas e adquiridas das mais fecundas para construir uma sólida individualidade artística. Entretanto, seduzida pelas teorias do que ela chama arte moderna, penetrou nos domínios dum impressionismo discutibilíssimo, e põe todo o seu talento a serviço duma nova espécie de caricatura. Sejam sinceros: futurismo, cubismo, impressionismo e tutti quanti não passam de ouros tantos ramos da arte caricatural. É extensão da caricatura a regiões onde não havia até agora penetrado. Caricatura da cor, caricatura da forma - caricatura que não visa, como a primitiva, ressaltar uma idéia cômica, mas sim desnortear, aparvalhar o espectador. A fisionomia de que sai de uma destas exposições é das mais sugestivas. Nenhuma impressão de prazer, ou de beleza denuncia as caras; em todas, porém, se lê o desapontamento de quem está incerto, duvidoso de si próprio e dos outros, incapaz de racionar, e muito desconfiado de que o mistificam habilmente. Outros, certos críticos sobretudo, aproveitam a vaza para épater les bourgeois. Teorizam aquilo com grande dispêndio de palavrório técnico, descobrem nas telas intenções e subintenções inacessíveis ao vulgo, justificam-nas com a independência de interpretação do artista e concluem que o público é uma cavalgadura e eles, os entendidos, um pugilo genial de iniciados da Estética Oculta. No fundo, riem-se uns dos outros, o artista do crítico, o crítico do pintor e o público de ambos. Arte moderna, eis o estudo, a suprema justificação. Na poesia também surgem, às vezes, furúnculos desta ordem, provenientes da cegueira sempre a mesma: arte moderna. Como se não fossem moderníssimo esse Rodin que acaba de falecer deixando após si uma esteira luminosa de mármores divinos; esse André Zorn, maravilhoso "virtuose" do desenho e da pintura; esse Brangwyn, gênio rembrandtesco da babilônia industrial que é Londres; esse Paul Chabas, mimoso poeta das manhãs, das águas mansas, e dos corpos femininos em botão. Como se não fosse moderna, moderníssima, toda a legião atual de incomparáveis artistas do pincel, da
pena, da água-forte, da dry point que fazem da nossa época uma das mais fecundas em obras-prima de quantas deixaram marcos de luz na história da humanidade. Na exposição Malfatti figura ainda como justificativa da sua escola o trabalho de um mestre americano, o cubista Bolynson. É um carvão representando (sabe-se disso porque uma nota explicativa o diz) uma figura em movimento. Está ali entre os trabalhos da Sra. Malfatti em atitude de quem diz: eu sou o ideal, sou a obra-prima, julgue o público do resto tomando-me a mim como ponto de referência. Tenhamos coragem de não ser pedante: aqueles gatafunhos não são uma figura em movimento; foram, isto sim, um pedaço de carvão em movimento. O Sr. Bolynson tomou-o entre os dedos das mãos ou dos pés, fechou os olhos, e fê-lo passar na tela às pontas, da direita para a esquerda, de alto a baixo. E se não o fez assim, se perdeu uma hora da sua vida puxando riscos de um lado para o outro, revelou-se tolo e perdeu tempo, visto como o resultado foi absolutamente o mesmo. Já em Paris se fez uma curiosa experiência: ataram uma brocha na cauda de um burro e puseram-no traseiro voltado numa tela. Com os movimentos da cauda do animal a broxa ia borrando a tela. A coisa fantasmagórica resultante foi exposta como um supremo arrojo da escola cubista, e proclama pelos mistificadores como verdadeira obra-prima que só um ou outro raríssimo espírito de eleição poderia compreender. Resultado: o público afluiu, embasbacou, os iniciados rejubilaram e já havia pretendentes à tela quando o truque foi desmascarado. A pintura da Sra. Malfatti não é cubista, de modo que estas palavras não se lhe endereçam em linha reta; mas como agregou a sua exposição uma cubice, leva-nos a crer que tende para ela como para um ideal supremo. Que nos perdoe a talentosa artista, mas deixamos cá um dilema: ou é um gênio o Sr. Bolynson e ficam riscados desta classificação, como insignes cavalgaduras, a coorte inteira dos mestres imortais, de Leonardo a Steves, de Velásques a Sorolla, de Rembrandt a Whistler, ou... vice-versa. Porque é de todo impossível dar o nome da obra de arte a duas coisas diametralmente opostas como, por exemplo, a Manhã de Setembro, de Chabas, e o carvão cubista do Sr. Bolynson. Não fosse a profunda simpatia que nos inspira o formoso talento da
Sra. Malfatti, e não viríamos aqui com esta série de considerações desagradáveis.
Há de ter essa artista ouvido numerosos elogios à sua nova atitude estética. Há de irritar-lhe os ouvidos, como descortês impertinência, esta voz sincera que vem quebrar a harmonia de um coro de lisonjas. Entretanto, se refletir um bocado, verá que a lisonja mata e a sinceridade salva. O verdadeiro amigo de um artista não é aquele que o entontece de louvores, e sim o que lhe dá uma opinião sincera, embora dura, e lhe traduz chãmente, sem reservas, o que todos pensam dele por detrás. Os homens têm o vezo de não tomar a sério as mulheres. Essa é a razão de lhes derem sempre amabilidades quando elas pedem opinião. Tal cavalheirismo é falso, e sobre falso, nocivo. Quantos talentos de primeira água se não transviaram arrastados por maus caminhos pelo elogio incondicional e mentiroso? E tivéssemos na Sra. Malfatti apenas uma "moça que pinta", como há centenas por aí, sem denunciar centelhas de talento, calar-nos-íamos, ou talvez lhe déssemos meia dúzia desses adjetivos "bombons" que a crítica açucarada tem sempre à mão em se tratando de moças. Julgamo-la, porém, merecedora da alta homenagem que é tomar a sério o seu talento dando a respeito da sua arte uma opinião sinceríssima, e valiosa pelo fato de ser o reflexo da opinião do público sensato, dos críticos, dos amadores, dos artistas seus colegas e... dos seus apologistas. Dos seus apologistas sim, porque também eles pensam deste modo... por trás".
segunda-feira, 17 de outubro de 2011
"Passou a hora das coisas bonitas"
No artigo intitulado "Passou a hora das coisas bonitas", o crítico literário Alceu Amoroso Lima (com pseudônimo de Tristão Athayde), chamava a atenção para a necessidade de se fazer uma literatura mais engajada com os acontecimentos sociais. No período de publicação de seu texto, o Brasil vivia o turbilhão de revoltas, críticas e apoio à Revolução de 30 (também conhecida como fim da República Velha, fim da era café-com-leite).
Para aqueles que consideram a literatura a arte da distração, do lazer, Alceu Amoroso talvez fosse incompreendido. A meu ver, seu mérito não deve ser descartado, uma vez que sua proposta de aliar o texto literário à transfiguração da ideologia social me parece muito válida. Aliás, acho que a qualidade da boa prosa romanesca está muito envolvida com essa proposta de Amoroso, isto é, está relacionada com a capacidade que o autor tem de conseguir transpôr para sua produção literária, a ideologia do seu contexto social. Literatura é isso.
Se os escritores fossem apenas produzir textos para conduzir seus leitores a outros espaços, a outras realidades, a literatura não estaria condenada a um reducionismo limitado, pobre e despropositado? É claro que nos tranportar para outras situações e realidades diferentes da nossa são características das belas letras, mas não nos esqueçamos de que literatura não é só isso; não é apenas isso.
A boa literatura é aquela que, assim como considerou Alceu Amoroso, é capaz de aliar tanto o projeto estético quanto o ideológico, ou seja, há que se ter um trabalho cuidadoso com a linguagem, mas há que se considerar os acontecimentos a nossa volta. Porque escrever um texto, significa (entre outras coisas) expressar nossas próprias idéias, nosso modo de pensar diante do mundo e, sendo assim, nossa opinião expressada através da linguagem tem o poder de influenciar outras mentes, seja ao nosso favor, seja contra nós mesmos. Porque, afinal de contas, se a literatura não pode mudar o mundo, ela pode, com absoluta certeza, tornar os sujeitos conscientes. É através da literatura que eu me conscientizo do que sou, do papel que exerço no meio; que questiono outras formas de pensar, que crio e construo meus próprios argumentos com relação ao mundo.
"Passou a hora das coisas bonitas", e já é tempo de mais posicionamentos, de engajamentos, de atitudes. Assim como o fez a 2ª fase do Modernismo brasileiro, é tempo de falarmos das coisas, do mundo e das pessoas, não mais de uma forma só bonita, floreada; mas falar de maneira mais real, mais concreta. Porque assim, a literatura poderá aproximar seus leitores de si mesma, e convidá-los a se reconhecer no seu trabalho estético e ideológico com a linguagem.
Por Thaís Silva
Para aqueles que consideram a literatura a arte da distração, do lazer, Alceu Amoroso talvez fosse incompreendido. A meu ver, seu mérito não deve ser descartado, uma vez que sua proposta de aliar o texto literário à transfiguração da ideologia social me parece muito válida. Aliás, acho que a qualidade da boa prosa romanesca está muito envolvida com essa proposta de Amoroso, isto é, está relacionada com a capacidade que o autor tem de conseguir transpôr para sua produção literária, a ideologia do seu contexto social. Literatura é isso.
Se os escritores fossem apenas produzir textos para conduzir seus leitores a outros espaços, a outras realidades, a literatura não estaria condenada a um reducionismo limitado, pobre e despropositado? É claro que nos tranportar para outras situações e realidades diferentes da nossa são características das belas letras, mas não nos esqueçamos de que literatura não é só isso; não é apenas isso.
A boa literatura é aquela que, assim como considerou Alceu Amoroso, é capaz de aliar tanto o projeto estético quanto o ideológico, ou seja, há que se ter um trabalho cuidadoso com a linguagem, mas há que se considerar os acontecimentos a nossa volta. Porque escrever um texto, significa (entre outras coisas) expressar nossas próprias idéias, nosso modo de pensar diante do mundo e, sendo assim, nossa opinião expressada através da linguagem tem o poder de influenciar outras mentes, seja ao nosso favor, seja contra nós mesmos. Porque, afinal de contas, se a literatura não pode mudar o mundo, ela pode, com absoluta certeza, tornar os sujeitos conscientes. É através da literatura que eu me conscientizo do que sou, do papel que exerço no meio; que questiono outras formas de pensar, que crio e construo meus próprios argumentos com relação ao mundo.
"Passou a hora das coisas bonitas", e já é tempo de mais posicionamentos, de engajamentos, de atitudes. Assim como o fez a 2ª fase do Modernismo brasileiro, é tempo de falarmos das coisas, do mundo e das pessoas, não mais de uma forma só bonita, floreada; mas falar de maneira mais real, mais concreta. Porque assim, a literatura poderá aproximar seus leitores de si mesma, e convidá-los a se reconhecer no seu trabalho estético e ideológico com a linguagem.
Por Thaís Silva
"Se me quiserem amar, terá de ser agora: depois, estarei cansada..." Lya Luft
"Se me quiserem amar, terá de ser agora: depois, estarei cansada..."
Depois poderei ser outra;
Depois poderei estar louca;
Poderei estar em outro lugar,
Poderei não mais te amar;
Poderei ter te esquecido;
Poderei não ter te ouvido.
Depois poderei viver,
e finalmente esquecer que demoraram para me amar..."
Enquanto houver gente ao meu lado, me ouvindo, me acompanhando, sempre haverá esperança de amor. Talvez, eu quisesse ser amada na hora, de imediato. Mas o amor é assim? Bem, não sei. Só sei que quero viver o que há de bom agora...
E é como diria Clarice Lispector: "Não se preocupe comigo. Eu sou muito feliz".
Por Thaís Silva
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