segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

"A literatura mata", diz o português Pedro Eiras, que lança novo livro


MARCIO AQUILES
DE SÃO PAULO

 
Reflexo das preocupações humanas primordiais, a morte sempre foi tema constante do universo livresco.
Entrelaçando histórias de escritores e personagens suicidas com questionamentos filosóficos, o escritor português Pedro Eiras, com a crença de que "a literatura mata", escreveu a obra "Substâncias Perigosas" (abreviação de um título gigantesco).
Misto de ensaio e romance metaliterário, o livro tece, de uma maneira bem-humorada e perspicaz, as considerações do autor sobre a relação --para ele intrínseca-- entre literatura e morte.
Como diz Eiras no livro, o poder mortífero das letras é como um veneno ou medicamento, que "só deveriam poder ser comprados com receita médica ou atestado de robustez intelectual".
"Conforme ia pensando nos autores, nos leitores, ia pensando também que todos os livros matam, que o perigo existe por todo o lado", afirma o autor à Folha.
Dividida em cem lições, "em que se explica por que meios os livros matam seus leitores" (como diz parte do quilométrico título), a obra foi concebida como um manual, um "folheto de instruções", escreve o autor.
"Coisa para usar. Um pouco como se o livro estivesse incompleto e abrisse um espaço para o leitor. Gosto desse desafio. Obrigar o leitor a fazer uma parte do trabalho, a pensar com o livro, em vez do livro", conta Eiras.
O último capítulo, inclusive, leva a experiência ao extremo e convida o leitor a concluir a obra, deixando para tanto até as linhas dispostas.

Patrícia Lino/Divulgação
Pedro Eiras com foto de Clarice Lispector; "Platão me mate, ou Cervantes, Álvaro de Campos ou Clarice", diz
Pedro Eiras com foto de Clarice Lispector; "Platão me mate, ou Cervantes, Álvaro de Campos ou Clarice", diz
EXISTÊNCIA TEXTUAL
O autor vai perscrutando ao longo da obra a tese de que o texto possui o leitor, que não teria direito nenhum e cuja única soberania consistiria em obedecer fielmente aos trâmites do texto.
O capítulo 97, intitulado "Última Hipótese", culmina com a conclusão de que "não sabemos ler a existência senão como texto".
"O livro não é um espetáculo em frente aos olhos do leitor. É um fogo que engole o leitor. Não existe a vida por um lado e a leitura por outro. Ler pertence à própria vida e transfigura toda a vida."
Questionado sobre seus próximos projetos literários --caso a literatura não o mate antes--, Pedro Eiras primeiramente diz querer reunir e editar seus textos teatrais em um único volume. E depois completa:
"A literatura vai matar-me mil vezes antes, e estou à espera: que Platão me mate, ou Cervantes, Álvaro de Campos ou Clarice Lispector", brinca.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Lúcia Miguel Pereira



Em tempos de literatura dita ‘contemporânea’, em que os livros publicados visam um público mais exigente, principalmente com relação ao tempo da leitura, confesso que tenho sentido uma profunda falta de críticos literários. De boa crítica literária, sobretudo.
E minha necessidade de leitura de boas análises sobre os romances é tão grande, que às vezes, penso ou estar totalmente por fora da realidade literária atual, ou realmente não se faz mais crítica como antigamente. Abro um parênteses, entretanto, para dizer que as colunas dominicais de Ferreira Gullar, publicadas na Folha de S. Paulo, têm sido meus guias de sobrevivência nesses tempos de escassez crítica.
Diante disso, volta e meia me pego lendo textos de pessoas mortas (infelizmente), que deixaram um legado extraordinário para o crescimento e o amadurecimento das letras no Brasil. É o caso, por exemplo, da crítica literária feita por Lúcia Miguel Pereira, que não somente nos abre os olhos para uma série de questões importantes sobre o romance brasileiro, como ainda nos fornece dicas preciosas de leituras.
Não preciso nem dizer que compartilho, profundamente, com as ideias postuladas por essa mulher, e ainda mais porque foi ela uma das poucas vozes femininas de seu tempo, que apareceram em jornais, livros e revistas, com textos críticos cujo conteúdo em nada se distanciava dos grandes comentaristas de literatura da época (me refiro  à década de 30 em diante, até meados dos anos 60 e 70 no Brasil).
Assim, eis Lúcia Miguel Pereira:
 “[...] escrever é coisa séria, não pode não deve ser atividade secundária”.
“[...] deveríamos preferir , se tivéssemos que escolher, a qualidade a quantidade – seria melhor que poucas pessoas fossem bem instruídas, do que todas o fossem mais ou menos”.
Em tempos em que o que vale mais é a grande vendagem de livros do que o amadurecimento de produções literárias, ou ainda, o lançamento de obras com profundo afinco estético e ideológico, Lúcia Pereira afirma que cada vez mais há menos escritores, há menos pessoas interessadas em se dedicar, exclusivamente, a literatura. “[...] enquanto não constituir uma profissão, a literatura não se revestirá de toda a sua dignidade, participará de muitas das fraquezas do amadorismo, muita gente continuará a pensar que é apenas uma prenda ou um divertimento”.
Embora os comentários de Lúcia Miguel Prereia tenham sido publicados na década de 40, no jornal O Estado de S. Paulo, me parece que tais postulações se adéquam perfeitamente ao cenário literário atual.
Assim, a crítica conclui dizendo que há um grande descompasso na relação entre a criação artística e o comércio de livros. “E, na verdade, o acordo entre as duas fases tão diferentes da vida de um romance [...] é dos mais melindrosos [...]”, pp. 192-193.


PEREIRA, Lúcia Miguel. Escritos da maturidade. – Rio de Janeiro: Graphia Editorial, 1994.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012



Em tempos de literatura dita ‘contemporânea’, em que os livros publicados visam um público mais exigente, principalmente com relação ao tempo da leitura, confesso que tenho sentido uma profunda falta de críticos literários. De boa crítica literária, sobretudo.
E minha necessidade de leitura de boas análises sobre os romances é tão grande, que às vezes, penso ou estar totalmente por fora da realidade literária atual, ou realmente não se faz mais crítica como antigamente. Abro um parênteses, entretanto, para dizer que as colunas dominicais de Ferreira Gullar, publicadas na Folha de S. Paulo, têm sido meus guias de sobrevivência nesses tempos de escassez crítica.
Diante disso, volta e meia me pego lendo textos de pessoas mortas (infelizmente), que deixaram um legado extraordinário para o crescimento e o amadurecimento das letras no Brasil. É o caso, por exemplo, da crítica literária feita por Lúcia Miguel Pereira, que não somente nos abre os olhos para uma série de questões importantes sobre o romance brasileiro, como ainda nos fornece dicas preciosas de leituras.
Não preciso nem dizer que compartilho, profundamente, com as ideias postuladas por essa mulher, e ainda mais porque foi ela uma das poucas vozes femininas de seu tempo, que apareceram em jornais, livros e revistas, com textos críticos cujo conteúdo em nada se distanciava dos grandes comentaristas de literatura da época (me refiro  à década de 30 em diante, até meados dos anos 60 e 70 no Brasil).
Assim, eis Lúcia Miguel Pereira:
 “[...] escrever é coisa séria, não pode não deve ser atividade secundária”.
“[...] deveríamos preferir , se tivéssemos que escolher, a qualidade a quantidade – seria melhor que poucas pessoas fossem bem instruídas, do que todas o fossem mais ou menos”.
Em tempos em que o que vale mais é a grande vendagem de livros do que o amadurecimento de produções literárias, ou ainda, o lançamento de obras com profundo afinco estético e ideológico, Lúcia Pereira afirma que cada vez mais há menos escritores, há menos pessoas interessadas em se dedicar, exclusivamente, a literatura. “[...] enquanto não constituir uma profissão, a literatura não se revestirá de toda a sua dignidade, participará de muitas das fraquezas do amadorismo, muita gente continuará a pensar que é apenas uma prenda ou um divertimento”.
Embora os comentários de Lúcia Miguel Prereia tenham sido publicados na década de 40, no jornal O Estado de S. Paulo, me parece que tais postulações se adéquam perfeitamente ao cenário literário atual.
Assim, a crítica conclui dizendo que há um grande descompasso na relação entre a criação artística e o comércio de livros. “E, na verdade, o acordo entre as duas fases tão diferentes da vida de um romance [...] é dos mais melindrosos [...]”, pp. 192-193.


PEREIRA, Lúcia Miguel. Escritos da maturidade. – Rio de Janeiro: Graphia Editorial, 1994.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Como o espaço aqui é de 'tutti', é claro que há uma vaguinha para Fernando Pessoa, um dos grandes mestres de nossa língua...
Aliás, Mário de Andrade que me perdoe pela traição (não é bem uma traição, mas digamos que uma mudança de foco, agora), mas Fernando Pessoa anda me 'lendo' integralmente. Acho que é a fase, ou sei lá.
Bem, chega de papo furado e vamos direto ao assunto. Qual dos heterônimos de Pessoa tê lê mais? Boa pergunta, heim? No meu caso, acho que tenho um pouco de cada um em mim. Mas de todos, o que sinto mais proximidade com meus sentimentos, com meu estado de espírito, com minhas inquietudes existenciais (olha a filosofia!rsrs) é o Alberto Caeiro. Grande caboclo, viu...
Como deixei meu livrinho em casa, posto agora algumas das perfeições poéticas de Pessoa, para que vocês apreciem e saboreiem cada verso, como eu...

"Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se o achar, segure-o!"


"Quero tudo novo de novo. Quero não sentir medo. Quero me entregar mais, me jogar mais, amar mais.
Viajar até cansar. Quero sair pelo mundo. Quero fins de semana de praia. Aproveitar os amigos e abraçá-los mais. Quero ver mais filmes e comer mais pipoca, ler mais. Sair mais. Quero um trabalho novo. Quero não me atrasar tanto, nem me preocupar tanto. Quero morar sozinha, quero ter momentos de paz. Quero dançar mais. Comer mais brigadeiro de panela, acordar mais cedo e economizar mais. Sorrir mais, chorar menos e ajudar mais. Pensar mais e pensar menos. Andar mais de bicicleta. Ir mais vezes ao parque. Quero ser feliz, quero sossego, quero outra tatuagem. Quero me olhar mais. Cortar mais os cabelos. Tomar mais sol e mais banho de chuva. Preciso me concentrar mais, delirar mais.
Não quero esperar mais, quero fazer mais, suar mais, cantar mais e mais. Quero conhecer mais pessoas. Quero olhar para frente e só o necessário para trás. Quero olhar nos olhos do que fez sofrer e sorrir e abraçar, sem mágoa. Quero pedir menos desculpas, sentir menos culpa. Quero mais chão, pouco vão e mais bolinhas de sabão. Quero aceitar menos, indagar mais, ousar mais. Experimentar mais. Quero menos “mas”. Quero não sentir tanta saudade. Quero mais e tudo o mais.
“E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha".

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Primaverandoooo



Primaverandoooo....

Como todo mundo sabe, o Dulce é um espaço reservado aos sensíveis de plantão como eu. E como já foi dito, o espaço aqui é tb destinado às fotografias que nos instigam e nos enchem os olhos...
Pensando nisso, minha gente, reservo o tema de hoje à chegada da Primavera, a estação mais florida do ano, por várias razões. Não somente por ser o momento em que as flores ‘renascem’, mas também porque em meio a toda essa nova vestimenta, os fotógrafos ganham um prato cheio de belas imagens...
Lá pelo dia 23 de setembro é que receberemos esse presente dos deuses, mas por hora, acrescento que não é só de flores que seremos contemplados. Há também a ilustre presença de uma brisa refrescante e do clima super agradável.
Pensando nisso, aproveito para dizer que nada mais gostoso do que unir o útil ao agradável, o que, no meu caso, significa a parceria entre clima bom+dedicação aos hobbies. Ou em outras palavras, Primavera+literatura (se é que me entendem...).
Assim sendo, dedico a vós, caros seguidores e blogueiros de plantão, o aproveitamento desse novo momento do ano, com a leitura de um caboclo tri legal: FERNANDO SABINO, ou mais precisamente, com a leitura de “A Inglesa Deslumbrada”. Aliás, digo ainda que caso algum de vocês já tenha lido e amado alguma obra desse sujeito, por favor, sintam-se convocados a dar seu parecer aqui. A correspondência entre o Sabino e a Primavera NÃO é despropositada; tanto um quanto o outro tocam os nossos sentidos e nos despertam de alguma forma (seja pela simplicidade aparente ou pela chegada estrondosa).
Para finalizar, miei amici (meus amigos), deixo uma frase sábia de Cecília Meireles:
“Aprendi com a primavera; a deixar-me cortar e voltar sempre inteira”.




E que seja assim conosco também. Salve a Primavera, e salve as belas fotos dela!!

Primavera - Vivaldi ( As quatro estações )

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Tem estréia nova no Dulce!!
Tudo bem que eu sou suspeita pra falar, mas a novidade é boa e merece destaque...
Para os apreciadores de literatura e, sobretudo, por crítica literária, como aquelas conversas gostosas que temos nos intervalos das aulas, ou no encontro com os amigos no sábado à noite, o livro "Vicissitudes literárias na criação da narrativa e no imaginário ficcional" chega para representar e incorporar tudo isso.
A obra representa a opinião dos autores que, diante de tantas leituras, decidiram manifestar suas vozes sobre os romances e os escritores que de algum modo, incorporaram o imaginário literário nas questões de memória, de relato de viagem, de quebra de expectativa, de rompimento com a tradição cultural, e de uma série de outras coisas que só a literatura tem licença para representar...
O livro é, na verdade, uma discussão aberta, uma conversa gostosa que busca interpretar o processo artístico de fazer uso da palavra para expressar a vida em suas mais diversas realidades.

Vicissitudes literárias na criação da narrativa e no imaginário ficcional                     Fica a dica e boa leitura!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

As facetas do Regionalismo...


Antes mesmo das discussões do Movimento Modernista, nos idos de 22, promover discussões no que diz respeito ao fazer literário, escritores consagrados pelo cânone acadêmico, no século XIX, já teciam comentários sobre questões relacionadas ao autor e o seu público.
            O exemplo mais pungente que destacamos aqui é o do escritor e crítico Machado de Assis, principalmente porque, entre outras coisas, sua produção ficcional consolidou o campo das letras e se perpetuou até os dias atuais, como o marco de um estilo literário que serve de referência para muitas produções ficcionais.
            Segundo Machado (cuja crítica pode ser analisada em seu célebre texto, “Instinto de nacionalidade”), qualquer que seja o assunto a ser tratado numa obra, de algum modo o romancista deixará transparecer certos traços de seu contexto sócio-cultural, de sua região de origem. De forma alguma, porém, tal característica deve ser vista como sinônimo de defeito ou sintoma negativo, pois, ao contrário, os aspectos referentes à sua região, revelam certa consideração do autor pelo seu ambiente natural, por suas próprias raízes.
            Entretanto, quando nos deparamos com taxações do tipo ‘literatura regionalista’, nos vemos novamente em face das propostas machadianas e, volta e meia nos perguntamos se era esse tipo de regionalismo a que o grande crítico outrora se referia. Afinal, elucidar traços de determinada região do país seria suficiente para identificar determinada prosa ficcional como regionalista? Creio que a noção regional proposta por Machado era algo que buscava ir além.
            Os aspectos relacionados a cenários, ambientes, descrições e detalhes de lugares, mostram-se como fortes aliados na composição de uma ideia de pertencimento do autor com seu contexto natural. Tal recurso se mostra ainda mais significativo quando criado num movimento de abertura da obra para recair no assunto em que ela propriamente focará. O Rio Grande do Sul, por exemplo, é introduzido na mente do leitor para, em seguida, respaldar a história que compõe a narrativa de Incidente em Antares, de Erico Verissimo. No entanto, o espaço gaúcho não é o destaque da obra, mas um adendo à narrativa.
            Por esse viés, podemos supor que muitas das obras tidas como regionais, ou o fizeram inconscientemente, ou desenvolveram artifícios para atrelar o enredo ficcional à história da identidade de sua região. Exemplos disso podem ser encontrados em Dona Flor e seus dois maridos, de Jorge Amado (para citar apenas uma das muitas obras do autor que reconstroem a Bahia, em muitas aspectos sociais e culturais) e João Guimarães Rosa, com sua mineiridade perceptivelmente incorporada em seus contos.
            Mas me refiro também às nuances inconscientes do escritor frente à sua criação, justamente para justificar aqueles casos em que falar de sua própria região não é algo premeditado, simplesmente acontece, como o caso de Rachel de Queiroz. “Mas a ficção funciona assim, você não sai da sua origem, não importa onde você esteja” (QUEIROZ, 1997, p. 36).
            Todas essas facetas do regionalismo implica em reconhecer que seu conceito é problemático e que, talvez, tenha sido muito usado de forma ‘pouco rigorosa’, como conceitua José Hildebrando Dacanal.
            Mas se de fato, retornarmos aos conceitos tão antigos, porém jamais ultrapassados, de nosso mestre, Machado de Assis, perceberemos que ser verdadeiramente regionalista é transcender os limites de seu próprio território; é partir dele sim, mas rumo a aspectos fora do espaço; é integrar a obra nos reflexos ideológicos, culturais, da mentalidade de uma determinada época, e explicar-lhe a razão de ser.
            Depois disso, talvez, nossa visão sobre o caráter regionalista se amplie um pouco, e grandes referências literárias como Os Lusíadas, por exemplo, passem a nos fazer mais sentido.  Não quero com isso dizer que toda obra passará a ser regional só porque trata de seu meio; mas realçar que a verdadeira magnitude literária é justamente aquela que em que o autor se faz homem de seu espaço e de seu tempo, sem se ater exclusivamente a eles. Eis Dom Casmurro, para nos comprovar isso.